20 de dezembro de 2006

Sensibilidade.

Meu lado nerd convicto pede licença para transferir pra cá um texto do vestibular da Unesp deste ano, que achei de uma sensibilidade! Tão rara que chega a doer. Me afetou. Érico Veríssimo, Incidente em Antares, 1974:
"Fez um novo silêncio. De fora vinham vozes humanas. De vez em quando se ouvia o zumbido do elevador do hospital. Tombou uma pétala de uma das rosas. Quitéria soltou um suspiro. Zózimo agora parecia adormecido. Tibério pensou em Cleo com uma saudade tátil. - Neste quarto, Tibé - disse Quitéria - dentro destas quatro paredes, nós temos falado em assuntos em que nunca tínhamos tocado antes. Nossa morte, por exemplo... - Pois não lhes gabo o gosto - resmungou Tibério. - Tibé, tens fama de valente. Vives contando bravatas, proezas em revolucões e duelos...patacoadas! No entanto, tens medo de pensar na tua morte, tens horror a encarar a realidade. - Tirou os óculos, limpou-lhes as lentes com um lencinho, e depois prosseguiu: - Que esperas mais da vida? Os nossos filhos estão criados, não precisam mais de nós. Mais que isso: não querem saber de nós, de nossas idéias, de nossas manias, de nossa maneira de pensar e viver. Acho que todo homem vê sua cara todas as manhãs no espelho, na hora de se barbear. Que é que o espelho diz? Diz que o tempo passa sem parar. E que essas manchas que a gente tem no rosto (tu, eu, todos os que chegam à nossa idade), essas manchas pardas são bilhetinhos que a vida escreve na nossa pele. Eu leio todos os dias esses recados, mas tu, Tibé, tu és analfabeto ou então te fazes de desentendido."
E então eu fiquei com essa idéia de "saudade tátil" na cabeça, não sai mais.

Nenhum comentário: